terça-feira, 10 de março de 2009

Goteiras

Tem coisas que sempre ficam para depois. O fio puxado no pulôver. Um barulhinho estranho no carro. Uma conversa com quem você ama. A goteira no telhado que só lembramos quando chove. Até que um dia cai o maior toró e o telhado quase cai na nossa cabeça. Aí vem a pergunta: por que não resolvi isso antes?
Parece até que estamos à espera de que os problemas se dissolvam sozinhos. A blusa está furada, mas a guardamos no armário assim mesmo. O filho cresceu e ainda toma mamadeira, e nós continuamos preparando o Nescau.
É quase uma coisa cultural. Afinal, qualquer roteiro de novela tem um diálogo em que a personagem sábia e apaziguadora da trama acalma a mocinha em apuros:
– O tempo cura tudo.
Tudo beleza na telinha da TV. Mas, por mais incrível que possa parecer, podem se passar anos e o tal problema não se resolve. Com tempo, isso sim, nos acostumamos com algumas imperfeições ao nosso redor. É como a porta dos fundos que precisa de uma levantadinha para abrir e fechar: é mais fácil ensinar o jeitinho para quem for usar a passagem do que consertá-la. E aquilo fica ali, literalmente emperrando a vida.
Tem gente que não se acomoda. Passa todo tempo disponível ajeitando tudo ao redor, ou procurando alguém que faça. A gaveta emperrou, dá uma lixadinha. Vai acabar a água, já liga para teleentrega. Fulana se desentendeu com Beltrana (já repararam que estas duas estão sempre se metendo em confusão?), chama a dupla para uma conversa. Leu um artigo dizendo que a China vai comandar o mundo, “bora” estudar mandarim.
São tão eficientes que não se conformam quando dão de cara com algo que não tem solução, mas aí é história para outra crônica.
E tem quem não se conforma com o mau funcionamento ao redor, se irrita e não resolve nada. Eu me encaixo mais neste perfil. Morro de inveja de quem resolve tudo, mas só de pensar no trabalhão que deve ser dá uma preguiça...
Aí aqueles que, como eu, são acomodados (porém irritados), vivem uma frustração tão constante quanto o problema que os assola. Andam com a pedra no sapato, praguejando sem parar, mas não são capazes de parar para descalçar e acabar com o incômodo.
A tendência é achar que tudo vai sempre estar ali, esperando por uma solução. Como as dezenas de casas deliberadamente construídas em áreas de risco no Vale do Itajaí. Demorou, mas elas caíram. O que os moradores estavam esperando? O que as autoridades estavam esperando?
O que me leva a perguntar: tem alguma coisa errada na sua vida?
O que você está esperando?
Mônica Torres
Publicado no Jornal A Notícia

Um comentário:

  1. Deise Prochnow16/4/09

    O tempo cura tudo?
    Não... apenas nos dá o que precisamos... tempo, para pensar, para encontrar a melhor solução e para agir...
    E quando não há o que fazer, há o que aprender. Episódios assim nos ensinam então que nem sempre a vida está em nossas mãos apenas, que paciência é um dom... e resiliência então!!!!
    E vamos agindo, aprendendo, nos conhecendo e sendo quem sabe, mais feliz a cada dia!
    Beijo Maia!

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